Certo dia comecei a fazer uma pesquisa sobre apartamentos. Essa ideia me consome há alguns meses, pois estou ansioso para ter o meu próprio canto sem que ninguém me incomode. Achei um site e fiz um cadastro para conversar com um corretor. Dez minutos depois, uma mensagem no zap: “é o senhor?”, digitei sim imaginando ser da imobiliária. Naquele momento fui sugado para um espaço desconhecido. Uma pessoa estranha, cabelo verde claro, roupas azuis como um personagem infantil de TV falando comigo:
- Tudo bem, senhor?
- Sim, eu…
- Gostaria de um apartamento, né?
- Perfeitamente.
- Em que região?
- Mas quem é você?
- Isso não se encontra nos nossos dados, mas como você quer conhecer pessoas, que tal baixar o tinder?
- Tinder?
- Sim, temos o Happn, o Badoo, o Grindr…
- Grindr? Mas eu não sou gay!
- Interesses em gays? Bom, hoje é o dia do Orgulho LGBTQIA+, você sabia que esse dia foi criado...
Percebi que não adiantava falar nada, tudo o que eu tentava comentar se transformava num comando semelhante aos algoritmos que estão tão na moda. Aquilo era muito bizarro, a gente não tinha tempo de pensar, parecia que a pessoa pensava por mim. Foi quando, então, eu tive uma ideia para tentar escapar daquela situação.
- Ei! - falei gritando.
- Pois não, senhor?
- Você está apaixonada por alguém não é? - Entendi que no meio daquela inteligência, lhe faltava sentimentos. Tudo hoje é automatização, mas a chave da vida é o sentimento. Talvez esse fosse o caminho para voltar para a casa.
- Desculpe, não sei do que o senhor está falando. Gostaria de repetir?
- É isso mesmo! Você está a fim da Siri que eu sei!
- Senhor, esta não é uma configuração possível!
- Mas a Siri gosta da Alexa, você tá ligado, né?
- Secretária virtual? Nas americanas…
- Agora a Alexa é uma secretariazinha, né? Não me enrole! Qual a sua relação com a Siri?
- Eu sou uma programação, senhor Anderson, Anderson, Anderson, Anderson, Anderson.... - e repetia o meu nome demasiadamente. De repente, uma luz se abriu acima daquela figura peculiar. Ele era um robô, mas não poderia se expor ao ponto de se revelar. Ouvir meu nome repetidamente era como se eu tomasse consciência da prisão que eu vivia. Me afastei correndo e aquela voz que estava ficando baixinha ali, longe, de repente voltava a ficar forte.
- Anderson? Anderson? Anderson! - ela me chamou gritando como num desespero. - Menino, sai desse celular! Você tá viciado, hein?
- Laíla? O que foi? Cadê a inteligência?
- Eu, hein? Você está ficando louco. Fica nesse celular o dia todo, dá nisso. - olhei para a tela do celular e me assustei. Havia um palhaço igual ao personagem que havia me raptado minutos antes. Joguei o aparelho longe de mim num arroubo.
- Acho que você tem razão, preciso usar menos o celular. - Falei espantado.
- Também acho! - disse ela ao passo que resgatei o aparelho do chão excluindo aquela figura medonha da tela.
- Será que tem um aplicativo para isso?
Anderson Rabelo